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Meu Sonho Parasita - Parte 2: Dumah

<terça-feira, 12 de março de 2013 


         Hoje resolvi começar a escrever mais cedo; o sol ainda não se pôs no horizonte. Boldor está deitado ao meu lado descansando da longa caminhada, diferente de mim, que prefiro me sentar, encostar numa árvore e ouvir o som do vento passando pelos seus longos galhos e balançando suas folhas. Esse é meu momento preferido do dia; sem o calor, nem o frio, apenas o frescor que logo dará lugar ao gelo insuportável da noite. Odeio essa estação.
         Já faz uns dois dias que não escrevo nada, porém minha cabeça não parou um segundo sequer. Estive pensando sobre as notas que meu caro amigo fez questão de me ajudar a perder. Contei sobre coisas que passei, histórias que meus avós contavam e até descrevi meus malditos sonhos que me acordam quase todas as noites, mas em nenhuma dela eu falei sobre quem eu era ou como me chamava. Se eu não as tivesse perdido, elas poderiam deixar de ser meu legado e ninguém saberia sequer o nome desse desafortunado de Tavilmor.
         Pois bem, me chamo Dumah Damascor. Nasci em Tavilmor, no 14º dia de Verão, ano 2 da 7ª Era. Sou filho de Boldor Damarcor e Ophelia Damarcor. O nome da minha família é tradicional de Earor, bem a oeste de nossa capital Boreah, onde são cultivadas diversos tipos de frutas, especialmente damascos, pela excelente madeira de sua árvore e seu fruto saboroso. Vovó era cozinheira e participara de quase todos os Festivais da Torta de Outono, em Tavilmor. Ensinou tudo sobre pães, bolos e tortas à minha mãe. Além disso, vovó fazia uma sopa de cenouras tão gostosa que só de ouvir mamãe falar “Dumah! Vamos passear em Earor?” já me abria o apetite. Já vovô era bem diferente; ele era carpinteiro. Além de vender madeira para outras vilas, também fazia belas mesas e cadeiras. Às vezes se aventurava em tentar esculpir algo, mas a madeira do damasqueiro é muito dura, difícil de se manusear, e vovô geralmente desistia. A casa deles era cheia de obras inacabadas e eu adorava; era um passatempo sem fim tentar entender cada uma delas.
         Meus pais também eram de Earor. Minha mãe era órfã e vivia numa fazenda com sua tia Mada, que não cheguei a conhecer. Ela desapareceu algumas semanas depois do casamento deles. Não era difícil encontrar mamãe chorando por achar que ela tinha ficado triste com o casamento e fugido. Eu tentava confortá-la e dar esperanças, mas nem sempre conseguia; na verdade muitas vezes a deixava pior. Acho que se sentia culpada. Antes de se casar, ela ajudava na fazenda. Às vezes, faziam queijo para vender na vila, mas nem sempre era possível por causa da idade avançada da tia Mada. Também não conheci meu pai. Era apenas um bebê quando ele se foi e nunca soube muito sobre a morte dele; sempre que eu perguntava, ouvia que ele tinha morrido por uma causa nobre, mas nunca me diziam o porquê. Talvez não tenham me contado por eu ser apenas uma criança e poder não compreender, mas isso foi perdendo a importância com o passar dos anos. Gostava da ideia de ter um pai herói, além de me encher de alegria tudo o que falavam dele. Mamãe, meus avós e até os mais próximos em Tavilmor e Earor, diziam que ele foi um marido carinhoso, um pai dedicado e um trabalhador muito esforçado, além de um homem muito valente. Em nossa vila, diziam até que ele era como um mago dos trigos e que suas plantações pareciam estar tão vívidas e douradas como o fogo ardendo na ponta de uma tocha... isso me fez lembrar o dia do incêndio... já faz quase um ano...
...
Já escureceu. Armei nossa barraca e acendi a fogueira para aquecer Boldor e me ajudar a enxergar melhor o papel. Precisei de uma pausa para limpar o pensamento e resolvi aproveitar o tempo para cozinhar alguns peixes que peguei mais cedo. A propósito, preciso domesticar esse cachorro! Além de lebres, coelhos e raposas, descobri que ele gosta de perseguir peixes e sapos. Foi quase impossível pescar hoje. Tenho medo de que um dia esse ser escale uma árvore atrás de pássaros e derrubar uma colmeia de maribondos sobre mim!
         Continuando, minha infância foi como a de todo garoto comum de nossa vila: estudos, tarefas de casa, ajudar no trabalho, brincar e arranjar confusão até me tornar um adulto. Eu, com quase 23 verões e depois do que houve em Tavilmor; depois de perder tudo o que tinha, toda minha vida, decidi ir para Earor, mesmo sabendo que minha única família agora é meu amigo Boldor. Talvez se souberem quem eu sou, eu consiga me sentir mais à vontade para prosseguir minha vida lá, de alguma forma. Infelizmente minha jornada terá de ser feita a pé! Não tenho dinheiro para alugar qualquer tipo de transporte e, honestamente, estou tentando evitar certos lugares, como Boreah. O lugar é maravilhoso, mas cidades ou vilas maiores costumam olhar com certo receio para forasteiros e, no momento, não quero dizer quem sou e de onde vim. Não sei exatamente o que houve em minha vila e posso ser acusado de ter sido o responsável por sua destruição. As leis daqui são um pouco severas e sem piedade. O atual governador da capital é uma pessoa fria, que muitas vezes aparenta não ter emoções. É sim uma pessoa justa, mas se achar que alguém é culpado por algo, o infeliz precisará de uma boa prova de sua inocência ou sem dúvidas sua nova cama será ou numa pequena cela ou a sete palmos sob a terra. Por isso, terei que contornar a capital pelo sul, tornando minha viagem muito mais longa; acho que devo estar quase na metade do caminho, afinal.
         Estou com sono. Acho que isso já basta para contar um pouco sobre mim e minha família. Por mais pequeno que seja, este é meu legado e não quero perdê-lo. No entanto, agora terei que ser mais cuidadoso; se Boldor perder minhas notas novamente, saberão que são de Dumah Damascor, de Tavilmor.
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